Em meio ao crescente descontentamento social devido ao aumento das tarifas dos serviços de telecomunicações em Cuba, um estudante da Faculdade de Ciências Médicas “Salvador Allende”, em Havana, tornou-se um símbolo adicional do mal-estar juvenil.
Sua intervenção durante uma assembleia estudantil, amplamente compartilhada nas redes sociais, confrontou diretamente a empresa estatal ETECSA, questionando sua política econômica e exigindo respostas reais, não justificativas vazias.
O jovem, em um tom firme e apoiado pelos aplausos de seus colegas, lembrou aos presentes e às autoridades que “a moeda deste país é a moeda nacional. A moeda deste país não é o dólar, não é a libra esterlina e não é o franco suíço”.
Con essas palavras, criticou as recentes restrições que limitam as recargas em pesos cubanos (CUP) a um máximo de 360 CUP em um período de 30 dias e a crescente dolarização do serviço, o que na prática exclui aqueles que só dispõem de pesos cubanos.
Mais adiante, visivelmente frustrado pela falta de respostas concretas, no mesmo encontro fez um apelo direto aos que presidiam a reunião:
“Eu o que insto, como conclusão desta reunião… é à diretoria da faculdade e ao secretariado da FEU a que tragam alguém do governo que possa nos dar a resposta que queremos ouvir, não a justificativa que temos ouvido desde a Mesa Redonda de há cinco dias.”
Sus palavras colocaram sobre a mesa uma queixa comum entre os estudantes: o cansaço em relação ao discurso oficial repetido e a falta de vontade política para enfrentar a crise sob uma perspectiva social.
Redes acesas: Orgulho, medo e solidariedade
A reação nas redes sociais foi maciça e emocional.
Decenas de comentários expressaram orgulho, admiração e também preocupação com possíveis represálias.
“Esse garoto me enche de orgulho, é assim que se fala”, escreveu um internauta; enquanto outros celebravam sua coragem: “Que emoção… esse garoto realmente tem coragem!” e “Meus respeitos, falou de frente e claro”.
Otros mensagens advertiam sobre a necessidade de apoio popular: “Por que o povo não está apoiando esses jovens? Este é o momento”, comentou um.
Também houve apelos à unidade entre os estudantes para se protegerem mutuamente: “Todos precisam se unir e não permitir que tomem represálias contra nenhum estudante por reivindicar um direito.”
Em meio ao apoio, também surgiu o ceticismo: “O triste é que o povo os está deixando sozinhos nessa reclamação, e os deixará sozinhos quando a situação ficar difícil”.
A resposta oficial: Mais repressão do que soluções
O paro acadêmico, iniciado em 4 de junho, se espalhou por universidades de todo o país, com epicentro na Universidade de Havana. Diante do crescente movimento estudantil, o governo escolheu fechar fileiras.
Durante seu pódcast semanal "Desde la Presidencia", Miguel Díaz-Canel, acompanhado pela diretora da ETECSA, Tania Velázquez, deixou claro que não haverá retrocesso no aumento das tarifas.
Segundo Díaz-Canel, suspender as medidas equivaleria a “renunciar a receitas para manter o serviço”, e alertou que o país poderia enfrentar um “colapso tecnológico” se decisões impopulares não forem implementadas.
“Quando ocorrer um colapso tecnológico, também então estaríamos sendo exigidos”, afirmou.
Tania Velázquez detalhou o alcance desse hipotético colapso: a impossibilidade de fazer chamadas, enviar mensagens ou acessar centros de trabalho e estudo.
O governo mantém sua postura inflexível, repetindo que é necessário “recuar um pouco para acumular o que nos faz falta”.
Um movimento que não para
Apesar dos tentar descreditar o movimento de paralisação acadêmica -acusando os estudantes de serem manipulados do exterior-, o movimento estudantil continua articulando demandas claras: tarifas justas, acesso equitativo à internet e a renúncia do presidente da FEU, Ricardo Rodríguez González, a quem apontam por defender os interesses do governo e não do corpo estudantil.
"ETECSA é uma empresa do Estado socialista" e "está agindo contra o povo", advertiu outro dos muitos estudantes que, nos últimos dias, levantou sua voz em prol da construção de uma universidade mais justa e de uma sociedade mais transparente.
Diante da censura, da apatia e do medo, os estudantes cubanos estão demonstrando que não querem continuar sendo meros espectadores do deterioro, mas protagonistas da mudança.
Sua luta não apenas interpela a ETECSA ou as autoridades universitárias, mas a todo um país que aprendeu a resistir em silêncio e que hoje começa, pouco a pouco, a falar em voz alta.
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